Nasceu flor sem ser regada
Pois sua sina lhe traduz
Fez-se meiga e delicada
Pelas mãos em ponto-cruz
Nunca foi tão desejada
Pois não pode ser colhida
Nem rebrotou na canhada
Nos corredores da vida
Essa flor zela queixumes
De partidas e chegadas
E mesmo sem ter perfumes
Traz odor de madrugadas
Nunca bebeu do sereno
Nem lacrimeja orvalhada
Guarda lágrimas e acenos
Das despedidas na estrada
Flor bordada “en el pañuelo”
Tens razões de ser assim
Guarda sonhos e desvelos
Sem anseios de jardim
Não enfeitas o cabelo
Feito rosas e jasmins
“Enjardina” meus pessuêlos
Sempre bem perto de mim
Florzita que o lenço abriga
Destinada a viver só
Enxuga ânsias sentidas
Que a ferem mais que enxó
Flor que a terra não foi ventre
E que ao fim não vira pó
Foi plantada inocente
Bordada por mãos de avó
Flor bordada que aflora
Ante a mão que não à rega
Mas que à leva campo fora
Pra florir junto a macega
E por isso nessa hora
-Florzita que guarda luz-
Resplandece junto a aurora
Num bordado em ponto-cruz